Exigir coerência é muito?
Afrânio Boppré – professor, economista e vereador do PSOL em Florianópolis
O processo participativo que culminou na lei do Plano Diretor de Florianópolis é um capítulo repugnante e triste de nossa história. Certamente, em breve estará sendo contado por estudiosos, analistas e de nossa sociedade. Neste artigo, não é minha intenção fazer um balanço, mas chamar a atenção para um aspecto. Parto do fato de que sob o comando do prefeito Cesar Souza Jr. (PSD) uma maioria de vereadores na Câmara fez aprovar, com tramitação legislativa não regular, a ”toque de caixa”, polícia, arma de choque, spray pimenta e sangue derramado a lei que pretende regular o ordenamento socioespacial de nosso município. Sequer houve espaço para que, em audiência pública, os vereadores pudessem apresentar e justificar as suas mais de 600 (seiscentas) emendas apresentadas. Friso que uma chuva de ações judiciais e liminares questionaram a tramitação da matéria colocando a cada momento lances que impactavam o desenlace.
A prefeitura, a procuradoria da Câmara de Vereadores e o próprio juiz federal Marcelo K. Borges entendem que a lei está em vigor. Não obstante este último determine em sentença refazer o processo participativo, vez que a lei federal foi ferida. Ora, diante de tamanha força de opinião mesmo duvidando reconheço a vigência da lei. Então vamos a ela.
O seu artigo de número 308 diz que: “Compete ao IPUF promover a convocação e o cadastramento dos representantes da sociedade civil organizada, assegurando–se de promover ampla divulgação e avaliar se as mesmas possuem objetivos e afinidades com a política de desenvolvimento urbano, organizando, no prazo máximo de noventa dias após o início de vigência desta Lei Complementar. Parágrafo único. Cada entidade terá direito a indicação de um representante e seu respectivo suplente, e poderá votar em até dez representantes entre os indicados, sendo eleitos aqueles mais votados.” Sendo assim, há de se perguntar: A lei complementar é datada de 17 de janeiro de 2014 e faltam três dias para o prazo findar. Por que o IPUF nada fez? Agrava a situação o fato de o IPUF estar regulamentando o Plano Diretor por meio de decreto e em flagrante descumprimento ao artigo 305 que define a natureza do Conselho da Cidade, senão vejamos: “O Conselho da Cidade é órgão superior do Sistema Municipal de Gestão da Política Urbana (SMGPU), vinculado diretamente ao Gabinete do Prefeito, atuando como colegiado representativo do poder público e dos vários segmentos sociais, de natureza consultiva, tendo por finalidade de implementar o Plano Diretor, acompanhar a elaboração dos projetos setoriais, estudar e propor as diretrizes para a formulação e implementação da Política Municipal de Desenvolvimento Urbano, bem como acompanhar e avaliar a sua execução, conforme dispõe a Lei n. 10.257, de 2001 – Estatuto da Cidade.”
A participação popular foi golpeada durante a elaboração da lei, sua aplicação, feita as escuras, sem transparência, ferindo a própria Lei do Plano Diretor é mera continuidade da mesma politica. Tudo advém de uma concepção de mundo, da velha política, governar de modo a favorecer os interesses particulares e menores. O IPUF, está sucateado é verdade, porém, cumprir a lei que ele próprio elaborou é o mínimo que se espera. Exigir coerência é muito?